terça-feira, 28 de março de 2023

Lyndall Fownes Urwick, o homem que firmou os princípios da administração


Todo negócio precisa de um líder. Mais que um simples gestor ou chefe, estamos falando de alguém que tome as rédeas da empresa e consiga motivar, alcançar resultados e ser inspiração para os seus colaboradores. Tal concepção mostra-se nítida nos dias atuais, em que cada vez mais crescem cursos sobre liderança e despontam técnicas para desenvolver o líder que há dentro de cada um de nós.

Há quase um século esse tema tem sido estudado pelos administradores, mas o pontapé inicial para o desenvolvimento dessa área foi dado por Lyndall Urwick, um teórico clássico do início do século XX. Lyndall Urwick foi responsável por criar os princípios da liderança e provou, ao longo de suas consultorias e livros, o indispensável papel de um líder dentro de qualquer negócio, do pequeno ao grande empreendimento. Por isso hoje conheceremos um pouco mais sobre sua biografia.

Os primeiros anos de Urwick

Lyndall Urwick nasceu em 1891, no pequeno condado de Worcestershire, Inglaterra. Desde pequeno sua criação indicava o mundo da administração, uma vez que seu pai era sócio de uma importante empresa da região, a Fownes Brothers and Company, uma empresa voltada para a fabricação de luvas dos mais variados tipos. Urwick cresceu observando seu pai tomar conta da empresa e em 1913, após terminar seus estudos universitários em Oxford, o primeiro emprego do jovem Lyndall foi na empresa do seu pai.

Porém, a vida de Urwick - e a de milhões de outras pessoas - deu uma reviravolta com o início da Primeira Guerra Mundial (1914 - 1918). Apenas um ano após ingressar no mundo dos negócios a guerra tragou Urwick para as trincheiras, fazendo-o lutar como oficial no front ocidental. Alistado pelo exército inglês, o jovem administrador lutou na França e chegou a ser condecorado com a cruz militar do império britânico. A medalha é a mais alta condecoração militar e só é dada para aqueles que enfrentaram o inimigo “cara a cara”, dando assim uma prova de coragem e lealdade com a Coroa Britânica. Urwick ainda chegou a se tornar major e mesmo sob momento de extrema tensão conseguiu lutar os quatro anos de guerra e voltar para casa.

A vida de Urwick no pós guerra não voltou à normalidade de imediato. Ele ainda continuou servindo por alguns anos no exército pois era necessário uma reorganização da estrutura militar. Nesse momento os conhecimentos de administração de Lyndall foram úteis para a companhia em que atuava e, em contrapartida, a vivência militar o ajudou a desenvolver alguns conceitos que mais tarde seriam utilizados em suas próprias teorias. Um desses conceitos, por exemplo, é o da organização linear. Basicamente, uma organização linear preza pela verticalização de uma empresa, mantendo uma hierarquia bem definida entre os participantes, criando assim uma cadeia de comando e ações eficazes. Dentro da estrutura militar é natural esse tipo de organização e os anos no exército fizeram Urwick ver de perto como uma empresa poderia beneficiar-se desse modelo de organização. Anos depois, já em sua vida como administrador, Urwick se valeu do modelo militar para exemplificar as razões pelas quais a organização linear ajudava no crescimento e no gerenciamento de processos dentro de uma fábrica, quartel ou outro tipo de empreendimento. 

Entre o Taylorismo e a gestão humanista

Da metade dos anos 1920 até os anos 1940 a vida de Lyndall Urwick voltou-se plenamente para a administração. Ao sair do exército, o jovem de Worcestershire tentou retomar seu antigo emprego na empresa do seu pai, o que lhe foi concedido. Porém, as ideias de administração de Urwick não foram aceitas pelos donos da Fownes Brothers and Company. As relações de trabalho se acentuaram ao ponto de Urwick perceber que não poderia ajudar a empresa a crescer, pois a gestão estava presa a sua forma tradicional de gerenciamento. Pior que isso, os donos - incluindo seu pai - não conseguiam vislumbrar as dinâmicas de trabalho que estavam mudando naquele período, o que faria a empresa perder potência no longo prazo. 

Após deixar a Fownes, Lyndall foi empregado por outra empresa, a Rowntree. A empresa estava no ramo de produção de chocolates e buscava modernizar-se. Graças a Urwick o empreendimento conseguiu excelentes resultados e sua maneira de gerenciar as relações de trabalho, processos e as pessoas ganhou notoriedade entre os empresários de sua época. Com o tempo, Urwick passou a dar consultorias para outras empresas, aplicando os princípios de liderança e gestão que mais tarde estariam em seus livros.

O grande diferencial do método de Urwick estava na sua capacidade de conseguir juntar duas teorias da administração que, naquele tempo, pareciam inconciliáveis: O taylorismo e a gestão humanista. Enquanto o Taylorismo tinha como prioridade a eficácia na produção, o humanismo tinha como base criar boas relações para que os colaboradores trabalhassem de maneira satisfatória. Urwick encontrou o meio termo entre essas duas teorias da administração e assim pôde impulsionar os empreendimentos aos quais prestou seus serviços.

O reconhecimento pelo seu trabalho veio ainda no final dos anos 1920, quando Urwick foi nomeado para ser diretor do IMI - International Management Institute. O IMI foi o primeiro instituto de administração a nível global, tendo foco em desenvolver e propagar as teorias da administração que surgiam naquele momento. Apesar de ter existido por apenas alguns anos - o instituto seria fechado em 1933 - foi no papel de diretor que o administrador pôde escrever dois dos seus principais livros: The Meaning of Rationalization (1929) e The Management of Tomorrow (1933). Com essas duas obras os princípios da administração de Urwick começavam a ganhar asas, saindo das consultorias e indo parar nas livrarias e cursos de administração pelo mundo.

Os princípios da administração de Urwick

Lyndall Urwick estabeleceu quatro princípios básicos para a administração:
1) O da especialização;
2) O da autoridade;
3) O da amplitude administrativa;
4) O da definição.

Nos dias atuais há uma série de estudos sobre cada um destes princípios e por isso não entraremos em detalhes quanto a cada um deles. Entretanto, vale destacar que Urwick não criou tais concepções somente a partir da sua prática como consultor. A bem da verdade, esses princípios já podem ser vistos nas teorias de Fayol e Taylor, porém a sistematização de Urwick e sua flexibilidade em juntar diversas teorias é, talvez, o grande mérito desse pai da administração. Visto isso, vamos conhecer um pouco mais sobre os princípios destacados. 

Começando pela especialização, para Urwick era fundamental que dentro de uma empresa os papéis de cada funcionário estivessem claros. Além de melhorar a organização dentro da estrutura empresarial, esse princípio auxilia no desenvolvimento da produção.

O princípio da autoridade talvez tenha sido o mais bem definido por Urwick, uma vez que a partir dele desenvolveu-se seus princípios de liderança. Com base em sua experiência militar, Urwick concebia um sistema hierárquico bem definido, com uma cadeia de comando que fosse reconhecida por todos os funcionários. 

Junto ao princípio da autoridade também podemos enxergar o que Urwick chamou de “amplitude administrativa”. Para ele, em cada cargo de chefia existia um número limitado de pessoas a serem gerenciadas. Assim, um gestor não deveria ultrapassar esse limite, pois a partir dele perderia-se o controle - e a autoridade - sobre os seus colaboradores. 

Por último temos o princípio de definição, que aponta para a necessidade de clareza nas informações e oficialização destas. Com esse princípio mina-se a comunicação paralela no qual alimenta-se boatos e intrigas dentro do corpo de trabalhadores. Uma vez que as informações partem de forma oficial e chegam com transparência para todos, elimina-se tais aspectos. 

O legado de Lyndall Urwick 

A vida de Lyndall Urwick continuou pelo viés acadêmico, tornando-se um respeitado teórico da administração. Ao longo das décadas de 1940 e 1960 o administrador atuou principalmente com consultoria, ajudando milhares de empresas a se restabelecerem. Sua principal atuação ocorreu no período pós Segunda Guerra Mundial (1939 - 1945), ajudando seu país a reerguer-se mais uma vez depois de outro conflito bélico.

Ao longo das décadas, outra paixão de Urwick foi o ensino. Dedicou-se a divulgar a administração por programas de rádios, principalmente pela BBC. Sua participação nos meios de comunicação e seus livros ganharam o mundo e assim a carreira de Urwick tornou-se, de fato, internacional. 

Nos últimos anos de sua vida, porém, retirou-se da vida pública ao aposentar-se e decidiu morar na Austrália. Foi lá que faleceu, em 1983, aos 92 anos de idade. 

Bom trabalho e grande abraço.

Prof. Adm. Rafael José Pôncio



Reprodução permitida, desde que mencionado o Nome do Autor e o link fonte.

 


terça-feira, 21 de março de 2023

Ferruccio Lamborghini, dos tratores aos carros de luxo


Os anos iniciais do futuro empreendedor Lamborghini

Nascido em 1916, na região da Bolonha, o italiano Ferruccio Lamborghini foi um homem de origem simples e que, mesmo após tornar-se grande em seu segmento, mostrou-se humilde em manter seus pés no chão. Filho de fazendeiros, o jovem desde pequeno mostrava uma habilidade especial em engenharia mecânica, principalmente no reparo das máquinas da propriedade da família. Ferruccio era o primogênito da família Lamborghini, começando desde cedo a ajudar seu pai na lavoura.

O trabalho braçal contrastava com sua paixão pelas máquinas, mas ambos foram fundamentais na formação moral do jovem e futuro empreendedor, como o valor do trabalho e o tempo correto de plantar e colher, preparando o terreno sempre para gerar as suas melhores condições. Todas essas ideias, que num primeiro momento parecem tão óbvias que são quase naturais, passam despercebidas em nosso dia a dia, uma vez que podemos acabar não as colocando em prática.

Aos 14 anos, Ferruccio decidiu sair da fazenda dos pais e ir ganhar a vida em Bolonha, percorrendo assim o seu sonho. O jovem, naquela altura da vida com pouca instrução formal, mostrou que o aprendizado adquirido foi por meio da prática e não através dos livros. Sua habilidade manual em consertar equipamentos chamou atenção dos proprietários da Casa Righi, uma fábrica da região. Assim iniciou a jornada de Ferruccio no mundo do trabalho fabril, começando como um aprendiz de mecânico e recebendo 15 liras por semana. A nível de comparação, no final dos anos 1920 uma unidade de dólar americano era equivalente a 19 liras italianas, sendo assim, o trabalho semanal de Ferruccio valia menos de 1 dólar.

O pouco dinheiro recebido é justificado por diversas razões: uma delas era o fato da Itália estar vivendo o regime de Mussolini, que após um golpe de Estado tomou o poder no país. Em contrapartida, o mercado internacional fez uma série de sanções econômicas, mergulhando a Itália em uma forte crise. Logo, não era possível pagar bons salários, ainda mais para um aprendiz de mecânico. Assim, por alguns anos Ferruccio sobreviveu com pouco, mas essa adversidade não foi capaz de parar o seu sonho.

Entrando nas forças armadas

Após 6 anos trabalhando na Casa Righi, Ferruccio resolveu ingressar nas forças armadas italianas. O ano era 1936 e suas habilidades como mecânico tinham um terreno fértil no reparo de aeronaves e carros. A larga experiência e habilidade de Ferruccio o levou a se destacar entre os seus companheiros, que quando não conseguiam resolver um problema o chamavam. Ferruccio, após analisar com cuidado, conseguia achar a causa da falha e atuar precisamente nela.

Aqui se apresentam dois destaques interessantes que nos revelam um pouco do espírito de Lamborghini: o primeiro é a busca incessante de solucionar problemas. Para Ferruccio, quanto mais desafiador a resolução, mais motivado se sentia. Essa é uma perspectiva interessante de se encarar os problemas que a vida nos proporciona, afinal, geralmente desejamos ter o menor dos problemas e que todos sejam de fácil resolução. O segundo é a brilhante noção de que todo problema tem uma solução, por isso bastava-lhe procurar com cuidado a falha e o que seria necessário para o conserto. Essa perspectiva detalhista fez de Ferruccio um empreendedor capaz de contornar uma série de problemas, visto que partia desse princípio tão básico, mas que nunca o percebemos.

Nos anos de guerra, notadamente a II Guerra Mundial (1939 - 1945) Ferruccio atuou pelas forças italianas, mas foi feito prisioneiro de guerra pelas forças armadas britânica e colocado à trabalhar como mecânico nestas condições. Assim, mesmo na fase mais difícil de sua vida, ainda assim sua profissão não lhe foi tirada. Seu aprendizado, como podemos perceber, foi totalmente prático e autodidata, uma vez que jamais precisou entrar em uma universidade de engenharia para compreender os princípios da mecânica e as leis que faziam suas máquinas funcionarem.

Despertando o Empreendedor Lamborghini

Após o final da II Guerra Mundial, Ferruccio voltou à Itália com uma nova perspectiva. Não podemos afirmar que os anos de conflito foram o fato crucial nessa mudança, porém é fato que o jovem que ingressou nas forças armadas em 1936 já não era o mesmo após 1945, quando decidiu não apenas consertar carros, mas construir os seus próprios modelos. 

Seu primeiro passo foi justamente reunir diversas peças e fazer, ao seu modo, um carro completamente novo. Graças ao fim da guerra, em toda a Europa montanhas de sucata eram acumuladas, resultado do combate entre as nações envolvidas. No território italiano essa realidade não era diferente e Ferruccio pôde aproveitar-se disso.

Juntando diversas peças, mas não de forma aleatória, Lamborghini fez o seu primeiro automóvel, que não era, evidentemente, um automóvel Lamborghini. Na verdade, esse primeiro modelo criado por Ferruccio era um híbrido, ou seja, a mistura de um trator com um carro. Esse protótipo foi chamado de “Carioca” e ao longo de dois anos foi sendo aperfeiçoado, até chegar a se tornar um modelo comercial. Ferruccio conseguiu fabricar 500 unidades do “Carioca” e vendê-los. Ao que se sabe, cada unidade foi vendida por 800 mil liras. Nesse momento (lembremos que a Itália foi derrotada na II Guerra Mundial) o valor da moeda italiana estava extremamente baixo, por isso cada dólar era equivalente há 525 liras (diferente dos 19 liras da época em que Ferruccio era apenas um aprendiz de mecânico). Convertendo os valores, o valor de cada “Carioca” girava em torno de 1.500 dólares.

O lucrativo negócio recém-nascido de Ferruccio o animou, fazendo com que se investisse em uma fábrica de tratores. A motivação pela construção de tratores se deu por alguns motivos, mas principalmente pela necessidade do país em retornar a uma economia de base e também pela familiaridade de Ferruccio com essa máquina, que foi a primeira ao qual teve seu primeiro contato com a mecânica, na fazenda de seu pai.

Uma resposta à Ferrari: nasce a Lamborghini

Somente em 1966, após um clássico episódio com Enzo Ferrari, foi que Ferruccio decidiu ampliar seus negócios e entrar no mercado de carros de luxo. Na época, com seu negócio indo muito bem, Lamborghini decidiu comprar uma Ferrari, porém, um problema no câmbio do carro o incomodava. O fabricante de tratores foi fazer suas reclamações em uma das lojas da Ferrari que, por acaso ou “destino”, estava Enzo Ferrari, o fundador da marca e também excelente mecânico. Enzo não aceitou bem a crítica de Ferruccio, dizendo que ele “nada entendia de carros e que ele devia contentar-se a andar nos seus tratores”.

A ofensa, porém, fez com que Ferruccio não apenas consertasse o problema do câmbio do seu carro, mas lhe instigou a fabricar o seu próprio carro de luxo. Assim nascia a marca Lamborghini. A entrada nesse novo ramo fez os negócios de Ferruccio escalonarem para outro patamar, graças a potência e qualidade do seu carro. A rivalidade com a Ferrari estava plantada, mas o fato é que Ferruccio apenas provou suas qualidades como mecânico.

A partir do final dos anos 1970, Ferruccio decidiu afastar-se dos negócios, visto sua idade avançada. O jovem de Bolonha, agora um senhor de mais de 60 anos, ainda seria condecorado pelo Estado com o título de "Cavaliere del Lavoro", graças aos seus serviços prestados para a economia do país. Em 1993, aos 76 anos, Ferruccio descansou, tendo uma morte por causas naturais. Seu legado, porém, mantém-se vivo.

Bom trabalho e grande abraço.

Prof. Adm. Rafael José Pôncio




        Reprodução permitida, desde que mencionado o Nome do Autor e o link fonte.       

terça-feira, 14 de março de 2023

Fritz Jules Roethlisberger, o homem que fez da fábrica um sistema social

O ser humano é um ser social. Basta olharmos para fora de nossa janela e percebermos o quão verdadeira é essa afirmação. De fato, nossa capacidade de organização é a melhor entre todas as espécies conhecidas, o que nos garantiu, ao longo de milhares de anos, desenvolver-se e se espalhar por todo o globo, tornando-se a espécie dominante da terra. Na natureza não somos os mais fortes, os mais resistentes e nem os maiores, mas sem dúvida somos os mais adaptáveis e inteligentes.

Visto essa grande vantagem da nossa espécie, seria impossível pensarmos em um estilo de vida em comunidade que não levasse em conta a subjetividade e os anseios humanos. Assim, criamos meios de nos divertir, formas de cultura e outra série de elementos imersos em nossa sociedade que nos causem satisfação, pois uma vez que tais demandas são contempladas podemos atuar de maneira mais colaborativa e eficaz.

Essa poderia ser uma conclusão de qualquer estudo sociológico a respeito da relação dos indivíduos e seu contexto social, mas foi, em parte, o que Mayo e seu grupo de cientistas descobriram através do experimento Hawthorne. Percebendo que os operários de uma fábrica não poderiam ser tratados como máquinas, essa geração de administradores levaram as ciências humanas para dentro do mundo industrial. Um dos grandes contribuintes para essa corrente da teoria da administração foi o americano Fritz Jules Roethlisberger, que não somente auxiliou Mayo em seu experimento, mas escreveu um dos principais tratados de teoria da administração. Por isso hoje conheceremos um pouco mais sobre esse pai da administração.

Fritz Roethlisberger entre a academia e a fábrica

A vida de Fritz Jules Roethlisberger iniciou no final do século XIX, em 1898, em Nova York. Advindo de uma família abastada, o jovem Roethlisberger pôde desfrutar de uma infância sem muitas preocupações, dedicando-se aos estudos e desenvolvendo suas habilidades. Naturalmente, buscou seguir o caminho do ensino superior, tornando-se um intelectual. Frequentou (e terminou) as faculdades de artes, em Columbia, de Química em Massachusetts e fez mestrado em filosofia, em Harvard.

Um currículo impressionante como este só se torna ainda mais chocante quando descobrimos que Roethlisberger estava com apenas 27 anos quando concluiu tais feitos acadêmicos. Analisando a trajetória universitária desse pai da administração poucos afirmariam que, anos mais tarde, ele estaria entrevistando operários em uma fábrica e desenvolvendo um dos estudos mais importantes da ciência da administração.

De fato, até 1925 pouco (para não dizer nada) que remetesse à indústria chamava a atenção de Roethlisberger. Seu destino como um professor universitário bem sucedido, com diversas honras e títulos, pareceria o mais correto e provável de acontecer, entretanto, quase nunca a vida é tão previsível assim. A história de Roethlisberger vai mudar no momento em que ele conhece Elton Mayo, em 1927. Àquela altura, Roethlisberger estava desenvolvendo um doutorado em filosofia, mas resolveu interromper suas pesquisas ao estar na presença de Mayo, que era motivo de grande admiração e respeito por parte de Jules.

O que mais impressionou Roethlisberger foi o fato de Mayo pensar de maneira distinta do senso comum a questão das relações de trabalho, criando um forte contraponto à teoria da administração científica. Não podemos afirmar com provas que o aspecto humanístico foi o que despertou em Roethlisberger a vontade de ajudar Mayo em seu experimento, mas basta pensarmos na própria formação acadêmica de Jules que perceberemos que não seria absurdo afirmar isso, uma vez que as ciências humanas estavam no meio de Fritz há muitos anos.

Sendo assim, Roethlisberger decidiu empenhar-se ao máximo para ajudar no experimento Hawthorne. Sua formação filosófica ajudou a embasar os fundamentos teóricos da teoria de Mayo, que, naquele momento, por mais que buscasse conduzir sua pesquisa aos moldes acadêmicos, deixava a desejar quanto a análise dos resultados e o método empregado. Roethlisberger, nesse sentido, foi uma peça fundamental para dar a consistência acadêmica que faltava em Mayo, sendo ele o responsável por tentar embasar as descobertas do experimento e criar assim a teoria das relações humanas.

Atuando como assistente de Elton Mayo entre 1927 e 1936, Roethlisberger não apenas adentrou ao mundo da administração, mas conheceu de perto a realidade dos operários em seu regime de trabalho voltado à máxima eficiência. Em 1939, junto com William Dickson, Roethlisberger lançou o seu livro “A organização e o trabalhador” 1 . A obra no mundo da administração é uma referência até os dias de hoje, não somente por suas ideias que mudaram, em grande parte, a visão que se tinha sobre a administração, mas também por ser um estudo de fôlego, com a rigidez acadêmica que se fazia necessária.

O diferencial da geração de Roethlisberger, quando comparada com os administradores científicos, talvez seja justamente o academicismo empregado em suas formas. Enquanto os científicos, notadamente Henry Ford, Frederick Taylor e Fayol, aprendiam sobre gestão na prática da fábrica, Roethlisberger e seus companheiros já estavam distanciados dessa realidade, aparecendo em fábricas somente para entrevistas e levantamento de dados, ambos fundamentais para a continuação de suas pesquisas.

Fritz Roethlisberger eternizando-se na administração

Mesmo não sendo um administrador “natural”, chamemos assim, Roethlisberger conseguiu contribuir de maneira eficaz na área da administração. Seguindo a corrente humanística, ele percebeu que a fábrica era, antes de tudo, um ambiente social. Isso significa dizer que os operários não são robôs, mas seres humanos e necessitam, tal como qualquer outro, de momentos de prazer, de relaxamento e de compromisso. Tais elementos, quando bem empregados, geram confiança no colaborador e este acaba produzindo mais.

A prova cabal dessa afirmação está no próprio experimento realizado por Roethlisberger, que mostrava, em síntese, a seguinte percepção: quando os entrevistados participavam da entrevista com perguntas pré-selecionadas, a resposta destes tendiam a ser genéricas e esquivas. Porém, quando perguntados sem nada para constrangê-los (como um chefe ou supervisor), estes conseguiam falar mais abertamente sobre suas demandas e ao sentirem-se partícipes da fábrica passavam a trabalhar mais. Além disso, outros fatores como a confiança no chefe, os odores exalados no ambiente e até mesmo a iluminação também ajudavam a tornar o ambiente da fábrica mais agradável e mais positivo para se produzir.

Seus demais trabalhos acadêmicos também buscam reforçar essa visão de mundo. Roethlisberger escreveu livros e artigos científicos até o fim da sua vida, tendo inclusive livros lançados postumamente. De fato, até 1974, ano de sua morte, ele atuou como professor de relações humanas em Harvard, cargo que ocupou por mais de 20 anos (1950 - 1974).

Sua dedicação à vida acadêmica fez com que sua vida privada se tornasse quase obsoleta nas pesquisas modernas. Por isso não sabemos exatamente detalhes de sua morte, assim como se teve descendentes. Assim, o silêncio destas informações denunciam uma possível vida anônima e solitária, na qual somente o desenvolvimento dos seus estudos era o centro. Apesar disso, mesmo sabendo tão pouco sobre a vida privada de Roethlisberger, a ciência e os estudiosos da administração jamais o esquecerão.

Bom trabalho e grande abraço.

Prof. Adm. Rafael José Pôncio


        Reprodução permitida, desde que mencionado o Nome do Autor e o link fonte.   

quinta-feira, 9 de março de 2023

Livro publicado:


A obra Os Empreendedores que Mudaram o Brasil, finalmente acessível. Este livro é um tesouro para qualquer pessoa interessada em história de grandes empreendedores, pois foram homens valorosos, de grandes ideais e a visão empreendedora que cada um desempenhou no contexto econômico e social no Brasil merece ser lida.

Neste fascinante livro, isento de termos técnicos, o economista e administrador professor Rafael José Pôncio apresenta em dez capítulos os grandes nomes do desenvolvimento brasileiro desde o império até os dias atuais, neste volume 1 são eles: Irineu Evangelista de Sousa – O Visconde e Barão de Mauá; Jorge Street; Roberto Cochrane Simonsen; Rolim Adolfo Amaro; Abílio dos Santos Diniz; Samuel Ramos Lago; João Carlos Paes Mendonça; Edson de Gogoy Bueno; Hércules Florence; Arthur Sendas.

Para melhor compreender o fenômeno empreendedorial no Brasil, esses agentes econômicos viveram em diferentes épocas históricas e circunstâncias de vida distintas, porém, o autor nos convida a analisar as virtudes de cada um, seus ideais, resiliências, superações, dilemas, descobertas, re-invenções e nos faz entender que o dna empreendedor por servir, fez destes empreendedores homens de negócios vocacionados pelo Brasil por força dos seus ensinamentos e legados.



Versão impressa disponível em:


terça-feira, 7 de março de 2023

Faça uma gestão inteligente com o método Kanban

Método Kanban

O método Kanban é uma ferramenta visual de fácil aplicação que pode ser utilizada na vida profissional e pessoal para gerir projetos.

Se você está precisando de mais organização em qualquer área da sua vida, prossiga com a leitura e aprenda como aplicar esta metodologia.

História do método Kanban

O método Kanban foi criado nas indústrias japonesas em 1940, mais especificamente na Toyota pelo engenheiro mecânico Taiichi Ohno.

Ele surgiu em contraponto ao sistema fordista que tinha como base a linha de produção, onde a fabricação era constante. Porém, com a crise de 1929, também chamada de “A Grande Depressão", este cenário mudou.

Como as pessoas já não tinham condições de comprar carros, os automóveis ficaram parados nas montadoras e concessionárias.

Vendo esta situação, o mercado japonês resolveu investir no oposto, ao invés de focar na produção, se concentrar no destino.

Neste modelo, a montagem só começa se já houver uma finalidade para aquele produto.

Por exemplo: uma fábrica recebe a demanda para a produção de 50 motores, as peças só entram em confecção se não existir no estoque ou nada já estiver sendo produzido na linha de montagem.

Assim, diminui os gastos com matéria-prima, armazenamento e otimiza a produção.

Você pode estar se perguntando, mas o que isso tem a ver com o método Kanban?

O Kanban entra como uma estratégia de comunicação para que os colaboradores saibam o que está sendo produzido, quando e quantos produtos devem avançar na linha de montagem e o que deve ser feito com urgência.

Como se aplica o método Kanban?

Colocar o Kanban em prática é algo bastante simples, para isso você precisa de 3 elementos:

  • Sistema visual: para que a metodologia funcione é primordial que exista um quadro separado por colunas para a divisão e organização das tarefas.

  • Cartões: as tarefas são incluídas no quadro através de cartões que permitem a ações mudarem de posição.

  • Limites: para que o sistema Kanban não vire uma bola de neve deve-se estabelecer um limite de itens que podem estar em cada coluna sem prejudicar o fluxo do trabalho.

O quadro “clássico”, por assim dizer, é dividido em 3 colunas: o que deve ser feito; o que está sendo feito e o que já foi finalizado. Conforme imagem abaixo:

método Kanban

Tipos de Kanban

Um dos destaques do Kanban é a sua flexibilidade, logo ele é aplicável em qualquer setor. As formas mais conhecidas de utilização são:

Kanban de produção

Como o nome já diz, ele é utilizado na fabricação, nele os quadros devem ser visíveis para todos os funcionários e conter informações como:

  • Descrição da atividade

  • Horário de entrada e limite para saída

  • O responsável

Normalmente são utilizadas cores para indicar o andamento das ações.

Kanban de movimentação

É como funciona o Sistema Toyota, nele o ritmo é ditado pela quantidade de itens.

Por exemplo: uma fábrica de motos deve produzir 300 motocicletas. Elas foram fabricadas em duas etapas de 150.

Então, só quando a primeira parte já tiver sido vendida é que começa a produção da segunda.

E-Kanban

Outro setor que se aproveita bastante do método Kanban e inclusive é responsável pela sua popularização é a tecnologia.

Os desenvolvedores de software encontraram nesta ferramenta uma maneira de facilitar a gestão dos projetos. Afinal, toda a equipe consegue ver o que está sendo feito, otimizar o trabalho e definir um tempo para a entrega do programa.

Estes são os principais tipos de Kanban, mas vale lembrar que a metodologia pode ser utilizada em qualquer área.  

Por exemplo: uma agência de marketing utiliza os quadros para definir as suas publicações nas redes sociais.

Você também pode usar a metodologia na sua vida pessoal para planejar o seu ano. Por exemplo:

  • Você define que deseja aprender outro idioma;

  • Escolhe as atividades -  fazer a matrícula em uma escola de idiomas; assistir séries legendadas;

  • E passa a executá-las conforme o cronograma.

Como fazer um quadro Kanban

Como já vimos, para aplicar o método Kanban não existe segredo, no entanto, existem ferramentas que você pode utilizar para facilitar o processo.

Supondo que a sua empresa não seja apenas um escritório, tenha filiais, funcionários em home office, etc.

Neste caso, não faz sentido deixar todas as informações somente em um quadro branco na sala de reuniões ou em um documento no Excel. É preciso encontrar uma forma de todos se comunicarem. Por isso, o uso de ferramentas online é o mais comum.

Um dispositivo muito utilizado é o Trello, um aplicativo de gerenciamento de projetos gratuito. O KanbanFlow também é uma ferramenta grátis que permite a organização de quadros Kanban.

Mas além do meio utilizado para criar o mural, é preciso saber o que incluir nele.

Então veja agora um passo a passo para criar o seu quadro Kanban:

1.   Mapeie o fluxo de processos

Antes de aplicar o método Kanban é preciso entender o fluxo de trabalho:

  • Como as demandas entram?

  • Que atividades são necessárias para elas serem concluídas?

  • Quanto tempo leva?

Estas questões devem ser analisadas de preferência em conjunto com a equipe, identificando o mais simples e o mais complexo.

2.   Defina os recursos

Como você já entende todos os processos,  é hora de estabelecer o que é necessário para manter o cronograma fluido.

Por exemplo: para fazer uma determinada arte o designer gráfico leva 5 dias, fazendo ele atrasar outras demandas. Talvez para a agência de marketing seja melhor contratar uma empresa especializada para realizar o serviço.

3.   Escolha as prioridades

O exemplo anterior também cabe neste tópico, já que definir o mais relevante é fundamental, assim, a atenção e os recursos ficam no que realmente importa.

4.   Elabore o quadro Kanban

Com a forma de trabalho definida é hora de colocar em prática, então chame a sua equipe e comece o mural!

Você pode manter a estrutura simples de 3 colunas ou inserir mais informações conforme a realidade da sua empresa.

Por exemplo: uma confeitaria decide incluir uma coluna explicando quais são os pedidos e outra com as entregas.

5.   Coloque em prática

Agora que você já fez o quadro é hora de incorporar no dia a dia da empresa. Por isso, é essencial fazer um treinamento com os colaboradores explicando o funcionamento da ferramenta.

Também esforce a importância de manter o quadro sempre atualizado, principalmente no começo, pois é natural que as pessoas acabem se esquecendo.

No entanto, quando os resultados surgirem será fácil manter esta cultura na empresa.

Vantagens do Kanban

Os principais benefícios de aplicar a método Kanban são:

  • Redução dos custos: ao limitar a produção é natural que se diminuam os gastos com estoque e desperdícios.

  • Otimização do trabalho: com o fluxo equilibrado e constante os colaboradores não ficaram ociosos durante o expediente.

  • Priorização das tarefas: é possível destacar as atividades urgentes, começando pelo mais importante.

Então, o que achou do método Kanban? Já aplicou na sua empresa, diga nos comentários.

Bom trabalho e grande abraço.

Prof. Adm. Rafael José Pôncio




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